segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Washakie y el Chico de las Manos Mojadas (2015)

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Washakie y el Chico de las Manos Mojadas de Eric Monteagudo e Orió Peñalver é uma curta-metragem espanhola de ficção ambientada no oeste norte-americano durante o século XVIII onde é relatada a viagem de Washakie (Bryan Ostolaza) um nativo americano em busca de água para salvar a vida do pai que, a dada altura da sua viagem, se cruza com um Cowboy (Daniel Horvath) por quem sente uma imediata e estranha atracção.
O argumento de Washakie y el Chico de las Manos Mojadas da autoria de Monteagudo contém interessantes e mordazes detalhes dignos de uma direcção que está, também ela, original, provocadora e extremamente bem sucedida. Num registo inicial, esta curta-metragem espanhola prende o espectador graças a todo um imaginário nativo-americano - a que tão vulgarmente chamamos índio - onde as danças tribais como preparação para as batalhas entre tribos e para com o inimigo "branco" e essas mesmas guerras e lutas cruzam as memórias que todos nós temos das eternas matinées televisivas onde perdíamos horas a testemunhar as mais diversas longas norte-americanas das décadas passadas e delirávamos com as mais diferentes incursões no cinema de género. Para qualquer um de nós que recorde ter vivido esses momentos, Washakie é, desde logo, um ponto positivo na recuperação dos mesmos.
Mas o sucesso desta curta-metragem não termina aqui. Toda a sua narração, imersa - a utilização desta palavra não é ao acaso dada a temática inicial da mesma - num misticismo abstracto que priva o espectador de um cenário de opulentas e majestosas paisagens brindando-o apenas com os elementos necessários para compreender que aquela viagem é repleta de perigos não só naturais como principalmente humanos, consegue fazer com que quem assiste a Washakie se preocupe com esses pequenos detalhes que o inserem num espaço normalmente inóspito. Em termos criativos, esta curta-metragem consegue portanto representar o selvagem oeste norte-americano como, ao mesmo tempo, manter a sua própria história e narração mostrando que os actores "em palco" não estão abandonados ou desprovidos de elementos que os transportem - e a nós - àquele lugar.
A água, tão importante então para a sobrevivência de populações que escassamente lhe tinham acesso, é uma constante. No entanto, o espectador é então levado para uma relação ora platónica ora de um intenso desejo entre os dois jovens homens que olham, observam e admiram o corpo do outro como que uma novidade que agora testemunham. Esta admiração que tanto pode ser confundida como a primeira mútua observação de "índio" e "homem branco", pode ser também confundida como uma relação homo-erótica estabelecida entre os dois jovens que não só começam a conhecer o mundo como também despertam para uma sexualidade que - tanto quanto é do conhecimento do espectador - está apenas agora a começar. Esta mútua contemplação - com breves momentos em que o toque e a sensação ganham forma e se assumem como fundamentais para a dinâmica entre ambos (como relação desejada e obviamente proibida) - é, também ela, submergida numa permanente lembrança da missão inicial - a água como elemento de salvação - e na diferença de "raças" (palavra tenebrosa) que então, mais do que nunca, fazia todo o sentido para uma terra que se pretendia conquistar e desbravar de influências indesejadas, ou seja, a sua população indígena.
Se a água é como uma salvação e se brota de um jovem cowboy que é então o "objecto" de admiração de um jovem nativo americano... poderá isto querer significar que a sua eventual relação não é, afinal, tão proibida como se poderia esperar? Ou, por sua vez, não poderá esta salvação de uma comunidade existir graças às "mãos" do outro? Num misticismo permanente que se cruza sem reservas num imaginário erótico, Washakie y el Chico de las Manos Mojadas parece ter brotado dos velhos western norte-americanos onde lendas e superstições cruzavam caminho com grandes batalhas, honra e continuidade de uma comunidade não esquecendo, no entanto, que esta continuidade é aqui vista com um olhar mais subversivo e felizmente pouco conservador que ganha forma graças a duas magníficas interpretações - de certa forma também elas contemplativas de um espaço ausente - de Ostolaza e Orvath, uma magnífica reconstituição histórica presente em detalhes como o guarda-roupa às mãos da dupla de realizadores em colaboração com Ana Peña e da pontual, mas essencial, direcção de arte de Eric Monteagudo, Miguel Monteagudo, Ricardo Ruiz e Gloria Tamarit que faz juz à velha expressão... less is more.
Destaque muito positivo ainda para a direcção de fotografia de Noel Mendez que abstrai o espectador da ausência de um cenário constante, obrigando-o a focar-se nos já referidos pequenos detalhes de construção de toda uma história de época sem que, no entanto, os actores estejam, de facto, lá.
Imaginativa, por vezes a exalar uma sensualidade quase animal e um interessante e mordaz retrato de uma sociedade que, então tal como agora, sobrevive à custa das necessidades maiores daqueles que num momento... nada têm.
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8 / 10
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